(do livro: Um cara bacana na 19ª. Editora Record, 1996)
Dois caras bem vestidos conversam num restaurante de luxo. Um tem uma empreiteira. O outro é advogado ilustre: defende traficantes e donos de escolas particulares.
– Tô chateado…
– Problemas no negócio?
– Não, não. Fiz prótese de silicone e nunca mais…
– Não tava falando do Bráulio, pô!
– Ih, desculpe. Cê tá vendo o estado da minha cabeça? Os negócios vão bem. Esse é que é meu grande problema.
– Como assim?
– Não tô metido em nenhum escândalo, tudo limpeza.
– Ora, meus parabéns! Só lamento não ter a oportunidade de defendê-lo.
– Pois é. Mas acontece que meus colegas de profissão estão pê da vida com isso. Me olham com ar de superioridade, como se eu fosse um amador. As crianças sofrem pressões na escola. Os amiguinhos apontam pra elas, cochichando pelos cantos: São filhos do “honesto”. Minha mulher me deu um ultimato: ou meu nome aparece no Caso Sivam ou devo considerar tudo acabado entre nós.
– Tsk, é uma sensação horrível, né? Já defendi um sem-terra e sei por experiência própria. No Brasil, não há nada mais solitário do que ter razão. Graças a Deus, agora represento as escolas particulares e vamos aumentar as mensalidades de maneira exorbitante, fora da lei, uma vergonha.
– Você é que é feliz!
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A historinha acima parece verdadeira, e, tal qual a marchinha carnavalesca, vai ver que é, vai ver que é…
Meu parceiro Guinga inventou um joguinho pra depois da pelada. De banho tomado, talquinho nas pudendas, diante de uma cervejinha (grapette, no caso do Guinga), um grupo de amigos rememora escândalos malucos:
– Cê lembra do Caso Brasdóscimo? Que horror! Um renomado economista, aluno do Galvêas – imitava o mestre até no bigode torto – , deu um estouro na corretora, matou a amante a golpes de panetone nacional, escondeu o dinheiro no cadáver e mandou o pacote pra Miami dentro de um freezer. O canalha teve a ousadia de escrever no papel da alfândega o conteúdo do freezer: loura gelada. Um fiscal, a fim de roubar a cerveja, descobriu tudo ao levantar a tampa. Durante o julgamento, o criminoso declarou: “Meu erro foi não usar um isopor escrito Kaiser. Ninguém chegaria perto…”
– E o estouro do Braderindus? Loucura. Grampearam, por engano, o telefone de um pedófilo pedindo a um anão do orçamento que subornasse alguém da área de cultura e lazer pra liberar uma verba visando à criação do Centrinho Cultural Braderindus, só para menores de doze anos. Houve superfaturamento nas negociações com o Bazar do Tonhão, para a compra de bolas de gás. A imprensa denunciou o fato, mas era tarde. Numa das salas do Centrinho, foram armazenadas, já cheias (Tonhão cobrou por fora pra soprar), cerca de setecentas mil bolas. Na véspera da inauguração, uma das duzentas e trinta e duas faxineiras, contratadas para a limpeza do Centrinho, jogou o fósforo, com que acabara de acender o baseado da Diretora, perto da tal sala, e BUM! Pra vocês terem uma ideia da violência do estouro, o Centrinho ficava na Piedade e a Diretora foi cair em cima da mesa de despachos do presidente Kléber Danoninho, na Gávea.
– E o Entupidor de Turiapemba? Paulista, abriu uma fábrica de gomas de mascar ecológicas, a Vapt-Vupt-Ploft. Vinham com figurinhas de verdes famosos, do Gabeira ao jequitibá. O sucesso foi enorme. O pilantra vivia cercado pelas “freirinhas ambientais”, tipo paquitas vestidas com folhas de samambaia-chorona. As moças começaram a desaparecer. Quase oito anos depois do primeiro sumiço, a polícia desconfiou e invadiu a mansão “Cardeal Clorofila”, como era conhecido, e descobriu cerca de setenta corpos das vítimas, plantados no jardim-de-inverno do assassino, transformados em plantas ornamentais. O detalhe macabro: todos os orifícios das moças estavam lacrados com chicletes.
O impressionante é que as pessoas que chegam na rodinha e não conhecem o jogo começam a acrescentar “fatos”, e a brincadeira cresce sem parar. Igual à realidade, né?
No final, os jogadores respiram aliviados:
– Puxa, ainda bem que não houve nada disso.
E o Guinga, com aquele sorriso triste que é a sua marca registrada, mete o último acorde:
– Mas vai haver, meu filho. Espera que vai haver…